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31.12.04

26122004: O Tsunami


Dia 26 de Dezembro de 2004 acordamos com a terrível notícia de um terramoto na Ásia.
Depressa o número de mortos atingia os milhares.
Dia 26 de Dezembro de 2004 tinhas 13 semanas de gestação. Dentro da minha barriga eu guardava o meu grande tesouro enquanto geograficamente longe, outros bebés escaparam das mãos e dos braços de outras mães e foram arrastados pelas ondas do Tsunami.
O terramoto de 8,9 graus na escala de Richter provocou ondas no mar, gigantes e diversos Tsunamis que arrasaram o Sri lanka, a Costa da Índia, a Indonésia a Malásia e a Tailândia, tendo assim transformado ilhas paradisíacas em lugares destruídos e assombrados por valas comuns.
O epicentro do terramoto foi localizado a 40 Quilómetros de profundidade, na costa Oeste da ilha de Sumatra, na Indonésia. Varreu o Oceano Índico e o mar que medeia a Índia e a Tailândia.
Depressa os traficantes de carne humana se instalaram no terreno, molharam a ponta dos dedos imundos na língua e esfregaram as mãos diante de tantas crianças que se viram abandonadas num caminho de terra que não vai dar a lado nenhum que tenha existido antes, ou diante de tantos bebés depositados nos hospitais de improviso que ninguém vem resgatar.
Não é propriamente a tragédia de causas naturais que me prende a garganta quando vou para falar, porque também me emociona todo o movimento de solidariedade que se gera espontânea e rapidamente, os médicos sem fronteiras que têm sempre as malas prontas à porta do coração, a gente que doa, os soldados e os generais em guerra de dedos suspensos no gatilho, os olhos arregalados, quando surpreendidos por outra guerra maior, não é propriamente a tragédia de causas naturais que me entope a garganta quando vou para falar, é a vergonha de haverem traficantes de crianças, de bebés, de mulheres, de animais, que negoceiam vidas enquanto o médico sem fronteiras se levanta da sua cama, do seu país, do seu continente, certamente com as fotografias dos filhos dentro de um bloco de notas como se vê nos filmes, para salvar uma vida.
É este mundo que eu te dou filho. Com a tragédia e a solidariedade por consequência. Com a desgraça humana e com a vinda dos que se servem dela por consequência. É este mundo que te dou por não haver nenhum outro mas tu podes escolher a parte melhor e pertencer à massa humana dos que são dignos. DIG-NOS.

3.12.04

Só eu sei o tesouro que carrego

Não calculas a felicidade que sinto. Está tudo bem.
Vim contigo, pequenino, impresso em película de radiografia, dentro de um saco de papel, a rir-me por dentro pelas costuras.
Só eu sei o tesouro que carrego.
Medes 3 centímetros e tens 9 semanas de gestação.
Sei que agora a minha preocupação são os teus movimentos, o teu tamanho, o bater do teu pequenino coração, em breve, o meu maior desassossego será ver reflectidas em ti as minhas virtudes e as minhas fraquezas e depois culpar-me ou orgulhar-me disso.
Já olhei três vezes para a película desde que comecei a escrever. Estou embevecida.
Acabei de fazer nova ecografia, desta vez na clínica de St.º António.
Não só repetis-te a gracinha da fotogenia como até houve ocasião em que mostras-te a mãozinha aberta como se quisesses dizer: Olá mãe!
Quem também assistiu à tua demonstração, foi a avozinha Ana, toda derretida… O avozinho João ficou cá fora, à espera, parecia ele que estava na maternidade a aguardar pelo primeiro choro. Quando lhe dissemos que estava tudo bem, quando ele olhou para a mesma película que guardo religiosamente e que já consultei mais umas poucas de vezes entretanto, os olhos dele encheram-se de passarinhos e de aves pequeninas que só eu vejo a sair dos olhos do meu pai. Só eu entendo.
Um dia ele olhará para ti com esses olhos emocionados, castanhos, transpirados, como no dia em que olhou para mim pela primeira vez.
Pieguices. Ou não.
Talvez sejam, e eu acredito mais, um sentimento perfeito.