O bicho-papão, a côca, o homem do armário ou do saco, são figuras tradicionais fictícias que servem para meter medo às crianças, quando elas se portam mal, não querem comer, nem lavar os dentes, nem andar na rua pela mão, nem ir para a cama quando os papás mandam. É anti-pedagógico fazer recurso a estas figuras. E é feio. É feio meter medo à crianças. E é perigoso (dizer que vem aí o papão e leva-te, vêm aí os comunistas e comem-te). As crianças podem ficar traumatizadas por terem passado parte da infância assustadas, a pensar "É hoje, é hoje que o homem vai sair daquele armário e nunca mais vou ver a mamã". Delegar à figura do bicho-papão e da côca a tarefa de dar a sopa aos nossos filhos é também ir pelo lado mais fácil. Difícil, já se sabe, é explicar-lhe que a sopa tem legumes, os legumes têm vitaminas, sais minerais, que alimentam, dão energia, fazem crescer e ele comer a sopa toda por causa disso. Lá em casa não há bicho-papão ou côca, não há nenhum homem dentro do armário, com um saco, para levar o menino, nem vem lá nenhum comunista, não, é anti-pedagógico, é feio, pode causar danos na cabeça do nosso filho, por isso quem vem lá é o Senhor das chaves. Quem vem lá se o Miguel não quiser jantar, lavar os dentes ou ir para a cama é o Senhor das chaves, que no imaginário do meu filho ainda é o recepcionista do hotel onde ficámos em Espanha, durante as férias, que nos entregava e recolhia as chaves do quarto com cara de poucos amigos, sem paciência para crianças e a quem nós apelávamos todos os dias à hora das refeições:
- Filho se não abres a boca para te enfiarmos mais uma colher de sopa, chamamos já o senhor da recepção, ele não gosta de meninos mal comportados que dão pinotes à mesa e não comem nada.
- Quem vais chamá mãe? O sinhôe da chaves?? Não!! Miguel come tudo, tudo, tudo.
Isto porque somos pais responsáveis e conscientes que não se deve (e é feio) assustar as crianças e ir pelo lado mais fácil.
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