oreinabarriga

este blogue está protegido pelos direitos de autor © todos os direitos reservados ao autor designado como carmina burana. a cópia não autorizada de conteúdos de propriedade intelectual e criativa protegidos pelos direitos de autor é ilícita e pode fazê-lo incorrer a si em processos civis e criminais ao abrigo da lei 16/2008 de 1 de abril.







este blogue tem Livro de Exclamações

18.7.08

A 'gaja que tinha uma pilha no lugar do coração

- Passei-me!
- Meu! Já repetiste esse verbo três vezes, desenvolve!
- Passei-me, ia tendo uma overdose!
- Passaste-te ou quê?
- Já te disse que sim.
- Ah pois já.
- O gajo até é fixe. Ele entra para nos dar uma g’ anda bronca, mas depois começa à procura das chaves da caixa do correio e nunca mais se lembra do que ia a dizer. Nem nunca chamou a bófia, nem népia, tás a ver? Eu até simpatizo com o tipo...
- Estás a falar do marido da Verónica? Até já lhe fizeste uma música...
- Mas é que aquele tipo parece uma lâmpada! Sempre atarraxado à Verónica, F**. Sempre com os olhos cheios de faíscas a piscar quando se atarraxa a ela.
- Deve ter a lâmpada fundida, naturalmente.
- O tipo empata! Mal sonha que estamos a conversar, lá vem ele, escada a baixo. O Jantar está na mesa, diz. Ontem desceu as escadas nove vezes! Nove meu! Ia morrendo de overdose!
- Gostas mesmo dela.
- Mesmo pá. Gosto mesmo. Podes crer.
- Drogas-te por causa dela?
- Não. Por causa dela deixava de me drogar.
- É a mesma coisa meu. A frase é que está ao contrário!
- O sentido é que muda, não vais lá?
- Aonde?
- Meu, ao sentido...
- Toma lá a cerveja, eu já não vejo sentido nenhum... não estamos a andar em contra mão?
- ... Há muito tempo.
- Aquilo ali é o nosso carro?
- É.
- Ainda é aquele chaço?
- Dá cá as chaves da mala. Hoje não vendemos nada. A feira da ladra já não é o que era.
- Eu cá fiz 2 pintores...
- A sério meu! Vendes-te as tuas inutilidades por 2 pintores! Ena... quem diria...
- As minhas inutilidades estão aqui, dentro da mochila, vendi foi... a ... pá, vendi... umas merdas.
- Que tipo de merdas?
- ... poesia...
- O quê?!
- Poesia... pronto, já disse.
- Tu vendes-te os poemas que a Verónica me escrevia? Os que ela me escrevia porque o sacana do marido dela andava sempre a atarraxar-se? As nossas conversas de pé de orelha?
- Tudinho... não sobrou um bilhetinho, um guardanapo de papel. Nunca pensei que aqueles papelinhos tivessem tanto valor!
- Tinham um valor imenso! Nenhuma matemática conseguia calcular!
- Valiam mais de 2 pintores?
- Muito mais! Mas muito mais!
- Ena meu... foi a primeira vez que vim à feira da ladra e não enganei ninguém, acredita... É pá, aguenta aí! Aquilo do carro ainda ser este era a brincar. Pá! Olha... pisgou-se. Paciência... vou a pé.

(Dez minutos mais tarde... )

- Ainda bem que voltas-te Carlos. Estou nas lonas. Se me pusesse a andar em vez de andar para a frente, fazia marcha atrás.
- Entra imbecil! A Verónica desapareceu.
- E eu com isso? E tu com isso? Ela gramava-te, tu és doido varrido por ela. Não tem nada a ver!
- Tenho um servicinho para ti. Não penses que fica assim, teres vendido os poemas que ela me escrevia.
- Servicinho? Que servicinho?
- Vais encontrar a Verónica.
- Eu?
- Tu.
- Euzinho?
- Tuzinho.
- É mais fácil encontrar o artista que me comprou os bilhetinhos. Não serve?
- Não serve. Eu quero que encontres a Verónica.
- Mas ela não te quer, meu! Passaste rés vés ao puto meu! Táva na passadeira, eu vi. P’ a que é que uma mulher daquelas quer um pilantra como tu? Ainda nem sequer gravaste um disco.
- Estamos conversados.
- E se ela não quiser vir?
- F**!
- Prontos, não se fala mais nisso. Mas não faças tangentes aos postes d’ alta tensão, estou a ficar maldisposto.
- Põe a cabeça de fora.
- Isso querias tu!
- Põe a cabeça de fora e o resto. Põe-te todo do lado de fora. É p’ a começar já. Toma uma fotografia dela.
- Quê? É a gaja? Nem sequer é gira! Nem tem peitos... maminhas... conteúdo, tás a ver?
- F**!
- Vendo bem... o papel da fotografia é que não é lá grande espingarda. A gaja até se come.

(Comecei a procurar)
Desci uma rua qualquer com a fotografia dentro do bolso, atravessada na minha cabeça.
A cada esquina vislumbrava uma gaja. Mas nenhuma parecida com a Verónica.
Nem semelhante. A Verónica tinha dentes.
Sentei-me na berma de um passeio também ele desdentado. Já não tinha a calçada toda. dentadura incompleta portanto. Era o passeio de um beco sem saída.
Estes termos rodoviários perseguem-me assim que me sento a puxar da heroína. Sinto-me em contra mão, de marcha atrás, num beco sem saída.
Quero lá saber! Puxei da prata, do isqueiro. Olhei em volta. Ia para snifar aquilo quando dei de caras com uma gaja. Voltei a olhar, mas só na direcção da gaja. Era mesmo a cara da Verónica. De resto, um bocado mais descadeirada. Mas um gajo para a fotografia, costuma endireitar-se todo.
Estava entretida a engatar um calhambeque que parou na estrada.
Aquilo ia demorar. Não há pressa.
Eu também tenho um calhambeque e sei bem q’ aquilo custa a pegar. Snifei. Levantei-me.
A minha cabeça a viajar. Já devem ter inventado o efeito heroína efervescente. Avancei.

- Como é que te chamas?
- Não vês que estou ocupada?
- Diz lá. És a Verónica?
- Não. Põe-te a andar. Não me espantes a clientela.
- Não és mesmo a Verónica?
- Não sou a Verónica e não tens onde cair morto, por isso, andor!

Não tenho onde cair morto.
Se não encontro a Verónica, não tenho onde cair morto.
Foi esta frase a razão de eu continuar a procurar.

- Que horas são?
- São horas de ir para a cama...

Aquela não era mesmo a Verónica.
Os olhos eram saliências mais preponderantes que as próprias maminhas.

Tinha que recorrer ao método de perguntar as horas. Estava a fazer-se noite na minha cabeça. Já não via um palmo à frente do nariz. Mais abaixo, a mesma pergunta. E a mesma resposta.

- Que horas são?
- São horas de ir para a cama.
- Caramba! As horas nunca mais passam.

Numa rua que me pareceu já uma cena repetida, vislumbrei uma paragem de autocarro.
Igualzinha à da outra cena. À espera do transporte estava uma rapariga. Ou era do efeito da heroína efervescente, ou aquela não era nenhuma gaja. Boa moca, boa cintura, boas saliências, olhos reluzentes.
Puxei da fotografia. Comparei.
Não, não era a Verónica, a Verónica não tinha verrugas no pescoço.
Continuei a procurar pela noite dentro.

Tarde das horas comecei a sentir uma erupção dentro de mim.
Tanta gaja num dia só, mais a efervescência... Entrei num estabelecimento daqueles com luzes de néon por cima que piscam ininterruptamente (que é uma coisa que me faz uma aflição, são as luzes a piscar eu a piscar os olhos e fico sem saber de que qualidade é o estabelecimento, tanto pode ser uma pensão reles como uma padaria) entrei (debaixo do braço de um bacano porque o porteiro, era uma discoteca, teimoso mais que a porta, não dizia outra coisa se não: - Lá para trás, vá, lá para trás!

Aquela batida entrou-me pelos ouvidos a dentro. Assim que abri as portas de vento, o coração a querer sair do meu corpo e a esbarrar nas minhas fronteiras, como as moscas contra um vidro.
Mais gajas debaixo daquela batida, a agitarem-se antes de serem bebidas.
Uma delas, veio pousar os braços em cima dos meus ombros.

- Olá.
- ...
- De onde é que nos conhecemos?
- Daqui...?

Deve-me ter confundido com o bengaleiro, mas eu não me descosi.
Pus-lhe as mãos nas nádegas. Apertei aquelas almofadinhas e devo ter sorrido então pelas costuras.

- Tu não te chamas Verónica pois não?
- Chamo-me Xana.
- Xana. Xana. Não serve, tem que ser Verónica.

Nunca mais a vi.

O mesmo foco de luz verde que a trouxe, foi o mesmo que a levou.
Fui sentar-me ao balcão. Pedi uma cerveja fresquinha. A meu lado estava um pintas que me tirou as medidas.
Estranhei. Desviei-me. Caí logo do banco, veio o foco de luz verde, sozinho, implacável, e já em cima de mim, apagou-se totalmente.

Quando consegui abrir a pestana (do olho esquerdo), vi os dedos dos meus pés ao fundo.
Quando abri a pestana do olho direito vi o pintas a fumar uma cigarrilha, os sapatos ao fundo da cama, as biqueiras viradas para cima no mesmo sentido dos meus dedos dos pés.
Dei um salto! Uma verdadeira acrobacia!
Só não fiquei pendurado na lâmpada, porque o tecto não tinha lâmpada.
Concentrei-me a ver se me doía alguma coisa. Nada, Só a cabeça, mas isso era consequência da batida. Da batida no tecto.
O pintas tirava-me as medidas outra vez, agora o comprimento, porque atrapalhei-me a calçar as peúgas e cai sobre comprido na alcatifa.

- Tenho um negócio de mulheres. De mulheres de sonho! Daquelas que não reclamam, não nos levam o guito, não choram por tudo e por nada, não estragam as nossas camisas com lixívia e marcas de ferro de engomar, e coisas do género, não...
- Você a mim não me engana, isso não são mulheres!
- São idênticas, só que a bem dizer, não falam. Têm a boca bem aberta mas não estrebucham. E nunca fecham as pernas. Têm um dispositivo que aquilo, meu amigo, nunca se fecha para obras. É sempre a abrir. Quer ver?
- E tem alguma Verónica?
- Verónica, Anabela, Ludovina Perpétua, o que você quiser!
O pintas deu-me a mão.
O cachucho do mindinho enfiou-se-me por uma falange qualquer a dentro. Levantei-me.
O pintas era a minha safa. O resto, ossos do ofício.

Abriu uma porta que dava para um compartimento escuro, mas cuja lâmpada do tecto se acendeu e deixou à mostra uma quantidade de prateleiras e de caixotes e de sacos do lixo de plástico, verdes, cheias e cheios de gajas igualmente de plástico (PVC. Poli cloreto de vinila. Insufláveis).

Aproximei-me.
Eram de todas as cores, de todas as qualidades.
Aproximei-me melhor.

- Até têm pormenores. – Disse eu a pegar numa com sardas, pelo tornozelo.
- Cuidado com as unhas. O silicone é sensível. Quando a gente as fura, elas emitem um aviso sonoro e voam pela janela às piruetas.
- Que cena!
- Olhe bem para esta beleza. Parece a Pamela, o mesmo silicone...
- Pois parece, mas não serve, a Verónica tem as mamocas assim, do tamanho de pêssegos, precisamente.
- Então tem esta aqui.
- É loira, também não serve.

Mostrei-lhe a fotografia. O tipo, especializado em tirar medidas a olho, esticou a fita métrica ocular.

- Também se arranja, mas só de encomenda, tem que esperar uma semana, nem tanto, mas arranja-se.
- Não vale a pena. Não é para mim sabe...
- Isso é o que todos dizem homem!
- Estou a d’ zer-lhe. Para mim até aquela ruiva ali, desmilinguida servia, mas p’ ó Carlos tem que ser uma Verónica, a verdadeira! De carne e osso!
- Não me diga que ele gosta daquelas que falam, se embonecam todas, choram, riem-se que nem umas perdidas, cuja depilação definitiva dura sensivelmente 2 semanas, não me diga uma coisa dessas!
- Não. Ele gosta mesmo é da Verónica. Da Verónica e mais nada. Estou tramado.
- Não está nada. Ainda há ali outro compartimento.
E nisto, abriu uma segunda porta.

Descemos por umas escadas. Descemos mais ainda.
Continuamos a descer.
Quando estávamos a um metro da Finisterra...

- Aqui vai encontrar certamente a tal Verónica.
- Obrigado pelo apoio psicológico.

Aquele compartimento não tinha porta. Olhei para o lado e um grande espelho exibia um fulano trinca espinhas, de mãos nos bolsos, a ponta dos dedos a mexer fora das calças esfarrapadas e um sorriso da província, bimbo mesmo.
Cumprimentei-me. Retribui a mim próprio aquele sorriso.

- Não tem por acaso um pente que me empreste?
- Por acaso até tenho.

Penteei os bigodes, como tinha visto numa cena, dum filme, na altura que gamava cassetes de vídeo. Só depois reparei que não tinha bigode. Já à muitos anos que não tinha. Desde que ele me apareceu, tinha eu meia dúzia de anos e já fumava.
Penteei a sobrancelha. Sobrancelha ainda tinha uma. A outra queimei-a uma vez, distraído. Nunca mais nasceu.

- Obrigado. Estou mais composto, não acha?
- É indiferente, sabe? Estas mulheres são mais sensíveis, de melhor acabamento, mas não ligam muito a essas paneleirices.

Entramos então numa sala com mesas redondas e cadeiras à volta das mesas. Ao fundo havia um bar, com barmen e tudo e mais espelhos, por todo lado, eu por todo lado, eu e o pintas e gajas. Umas dez. Sentadas nas cadeiras ou em bancos de veludo vermelho encostados aos cantos da sala, com uns reposteiros por trás, dourados a condizer.

- Isto é um mundo! – Disse eu a girar a cabeça à procura da Verónica.

Puxei de um cigarro. Veio logo uma, com um isqueiro estendido.
Acendeu-me a ponta. Traguei. Mandei o fumo para a atmosfera do ambiente.
A gaja engoliu-o e disse, com voz de ventríloquo (eram gajas articuladas, robôs):

- Trago qualquer coisa que tenhas acesa.

Engasguei-me. Tossi.
Veio logo outra dar-me palmadinhas nas costas.

- Também fumas?
- Todas as marcas.
- Até o Carlos?
- Quem é, Carlos?

Tirei a fotografia do bolso, aproximei-a da luz de uma vela acesa sobre uma das mesas.
Tinha encontrado a Verónica. A verdadeira. Só tive uma dúvida.
Virei-me outra vez para a gaja que me tinha dado as palmadas nas costas e rematei:

- Diz lá um poema.

E não é que ela disse? Ali, na hora, de improviso?

- Levo esta.
- Muito bem.

O pintas então mandou-a ir buscar as coisas dela, inutilidades de mulher e deu-me um abraço. Era escusado.

- Parabéns! Leva aqui uma mulher de luxo. De luxo! São 100 contos.
- 100 contos! Cem milenas! Cem? Cem?!
- Pronto, não dê mais pulos que ainda se aleija. Faço 99.

Para levar a Verónica dali para fora tive que abrir os cordões à mochila e lhe dar dois relógios que tinha gamado.
Para enfia-la (à Verónica) no autocarro é que foi o cabo dos trabalhos.
Transpirei como nos tempos que andava nas obras.
A custo lá entrou, mas assim que se apanhou lá dentro, estava eu a fingir que picava o bilhete e ela a sentar-se ao colo do motorista, a lamber-lhe os ouvidos e outras reentrâncias. O homem não apreciou.
Estava de serviço. É compreensível.
Lá consegui tirá-la daquela cena e sentei-a bem sentadinha à janela. Mas foi por pouco tempo. Não tardou nada, levantou-se, deitou a língua de fora e foi deireitinha ao motorista. Consequência disto, o autocarro desceu por uma ravina, tombamos todos uns para cima dos outros, alguns aproveitaram-se e tombaram para cima da Verónica, até que a viatura embateu contra um eucalipto.
Atordoado, arrastei a Verónica pela malinha das inutilidades, os saltos altos a encravarem-se-me na biqueira dos ténis, como agulhas, os collans rompidos. As saliências de fora.

(duas horas mais tarde)

O elevador demorava.
Eu a rezar para o Carlos não ter chegado ainda, para poder enfiar a Verónica na banheira, dar-lhe uma enxaguadela, vestir-lhe um pijama, deitá-la na cama...
O elevador demoraaaaaaaaaaaaava.
O baton da Verónica, sabia a remédio. A óleo de fígado de bacalhau ou lá o que era.
O elevador a abrir as portas, nas calmas. Entramos.
A mão dela enfiou-se p’a dentro do bolso das minhas calças, descosido.
Percebo finalmente a alucinação do Carlos por aquela gaja. Arranquei-lhe a mão do bolso, afinal o Carlos era o meu melhor amigo.
Voltei a por a mão dela no meu bolso. Que ça lixe!

O Carlos ainda não tinha chegado. Fui abrir a torneira do chuveiro. Pus a Verónica debaixo do repuxo e comecei a ensaboa-la toda. Esquisito era de cada vez que tocava nas reentrâncias e nas
saliências, parecia que estava a por os dedos na ficha eléctrica. Não curtia nada a sensação, as minhas veias ficavam como os fios dum cabo de alta tensão, em curto circuito, mas aguentei-me.
Enxuguei-a enquanto ela, língua de fora, pontiaguda, me limpava as orelhas dor dentro, como um cotonete.
Que robô mais maluca!

Desembrulhou-se da toalha, embrulhou-se a mim, e sem cerimónias, enxugou os pingos d’ água das reentrâncias nas minhas saliências.
Caímos na cama.
A língua dela, gelada, um friozinho por mim a cima, por mim a baixo. O elevador na escada a anunciar-se e eu não parava de gemer. As unhas da Verónica a cravarem-se-me nas costas, o elevador a abrir as portas, a Verónica a abrir as pernas, e eu sem saída a não ser o beco sem saída da Verónica a engolir-me com as unhas metidas nas minhas costas e o Carlos a meter a chave na fechadura. Gaita! Merda! Merda!
Enfiei-me no guarda-fatos. As portas não se fechavam completamente, o meu sexo entalado nas portas, acabei de gemer, a Verónica pela fresta das portas do guarda-fatos a enroscar-se toda como um parafuso, o Carlos a olhar para ela, embevecido de a ver:

- Minha heroína.

Antes de fumá-la num fôlego, mas aí... a gaja esmoreceu. Findou-se. Estancou.
O Carlos com uma lágrima ao canto do olho, feito maricas, a acariciar-lhe os cabelos espalhados pela almofada.

O Carlos ajoelhado na cama, a Verónica petrificada, a língua recolhida, os olhos fechados,
as unhas retraídas, as pernas juntas, hirtas como duas talas.
O Carlos a desfazer-se em lágrimas e em desculpas.
Enxuguei a testa à manga de uma camisa pendurada. O meu sexo todo metido para dentro, o que é que teria dado à gaja?

Abri a fresta do guarda-fatos um nadinha mais para puder ver melhor.
Foi então que o Carlos virou a Verónica de costas.
Desviou-lhe a cabeleira para o lado, encostou a palma da mão à altura dos pulmões, já esvaziados, e encontrou uma caixa.
Devia ser a caixa dos fusíveis. Disse eu para os botões.
(Não morri electrocutado no duche só porque não calhou!)
Afinal, vendo bem, era uma caixa de pilhas.
Nunca vi o Carlos naquele estado.
Nem com alucinações. Nem com a ressaca. Nem quando lhe vendi os poemas da Verónica na Feira da Ladra. Nunca o tinha visto naquele estado: Moribundo, desconsolado, sentido.
Atirou as pilhas para o balde do lixo. Saiu para a rua.

Deve ter ido comprar pilhas novas.
E agora o que é que eu faço? Com uma gaja que tem uma pilha no lugar do coração?

51 comentários:

Becas disse...

Que Post de partir a rir!
Nem que o Post se chamasse dois drogaditos às voltas com mulheres de pvc/ poli cloreto de vinila/ insufláveis e robô conseguia ser tão cómico.
Não sei Carminazita onde estavas com a cabeça para fazeres um Post assim mas ainda bem que estavas lá com a cabeça, está irreal!

Becas disse...

E
“mulheres de sonho! Daquelas que não reclamam, não nos levam o guito, não choram por tudo e por nada e coisas do género, não...”
Onde é que as há? Hum? Onde é que anda o pintas?

Becas disse...

o Ricardo que tens aí em casa não é o Araújo Pereira pois não? Se fosse, vocês dois a blogar… ui... era um fedor...

Rainha Reles disse...

“A minha cabeça a viajar. Já devem ter inventado o efeito heroína efervescente.”

É dessa que tu tomas não é? Para te sair um Post assim?
Tá genial sininho (seja onde for que estavas com a cabeça)

Rainha Reles disse...

Só tu para eu estar acordada a uma hora destas a olhar para o portátil feita parva a rir que nem uma perdida! (e agora vou às bolachinhas não é? Culpa tua, + um copinho de leite uma manteiguinha...)
Já que me puseste de bom-humor pode ser que depois das bolachinhas olhe para o Becas e lhe ache graça. A ver...

João Ayres disse...

já dei umas boas gargalhadas a ler o teu post! e agora? são 02:00AM, o que é que eu faço? Com uma 'gaja que tem uma pilha no lugar do coração?

João Ayres disse...

ela achou-te graça Becas?
deve ter achado (mudaste-lhe a caixa dos fusíveis não foi?)

Carmina Burana disse...

Foste dar nas bolachinhas e no pão com manteiguinha?? minha perdida...(rainha reles) espero que tenhas achado piada ao Becas e tenhas queimado essas calorias.

Carmina Burana disse...

E tu meu querido (João Ayres)?
A uma hora dessas (02:00AM) para que queres tu uma ‘gaja com uma pilha no lugar do coração?
tens a matriosca (boneca russa, daquelas que se abrem e tem muitas lá dentro)

Anónimo disse...

O teu 7º sentido é o conotativo e está apuradissimo.

david

Carmina Burana disse...

Está. O do tacto é que está um bocado parado.

Anónimo disse...

Andas ceguinha.

david

Carmina Burana disse...

E tu? Andas perdido?

Anónimo disse...

Ando à procura da Verónica.

david

Carmina Burana disse...

Mau...

Anónimo disse...

Já achei, está descansada.

david

Carmina Burana disse...

Menos mal.

Anónimo disse...

Deixa cá po-la no bloglines para não andar às apalpadelas.

david

Carmina Burana disse...

Com tanto feed bom que há...

Anónimo disse...

Um robô dá sempre jeito.

david

Carmina Burana disse...

Vai mas é blogar algo de novo que o teu feed anda muito parado, não blogas à uma semana e eu começo a sentir a tua falta.

Anónimo disse...

Vou hoje à CHIP7 comprar um teclado novo, já dei conta de dois (num mês!) estou com 1 que aquelas teclas a martelar no cérebro dão cabo de mim.

david

Carmina Burana disse...

sim, e a câmara digital também deve estar avariada...

Anónimo disse...

Não, isso do não postar fotografias já é das imagens que não andam a posar para mim.

david

Carmina Burana disse...

Inspira-te. Que mais posso eu dizer?
Foi um prazer (este bocadinho).

Anónimo disse...

Essa deixa era minha, mas td bem, eu logo faço um Post só para ti.

david

Carmina Burana disse...

Faz lá isso, para eu ir à inauguração do teu teclado novo.

Becas disse...

O que tu queres (João Ayres) sei eu!
"Ela achou-te graça Becas?" Achou achou e a tua Matriosca? tem para aí umas 10 caixas de fusíveis não é?
A mim não me enganas tu...
Querias era a Verónica, a verdadeira, a de carne e osso, mas ficas a chuchar no dedo.

Becas disse...

Mas não chores, tira um curso de electricista (com uma matriosca vais precisar)

Becas disse...

Ou compra um carregador de pilhas, melhor, muda para aquelas de pvc/ poli cloreto de vinila/ insufláveis que não têm tanto software.

Becas disse...

A querer dar na 'heroína'... olha meste.

Rainha Reles disse...

“Mudaste-lhe as caixa dos fusíveis?”
Mas tu estás a chamar-me robô João Ayres?!

Gema disse...

O Post está hilariante, o amigo do “Carlos” é uma pedra, a cena da feira-da-ladra e a Verónica no quarto...
Ainda estou a rir que nem uma parva agora com a matriosca e as bonecas. Vocês são doidos varridos!

Gema disse...

E agora como é que eu saio daqui?

MiudaCute disse...

De bonecas de pvc percebes tu não é Becas?
Tens cortado as unhas ao menos?
Estás a massacrar o João (Mete-te com ele, mete).

MiudaCute disse...

Carmina b.: Como é que tu te sais com um texto assim? Sentas-te ao computador e sai tudo de rajada? Ou é uma compilação de ideias que vais tomando nota, umas mais antigas outras mais recentes e depois misturas tudo num vaipe que te dá? Tu ainda escreves à mão? Em que é que te inspiras? Estavas mal disposta ou bem disposta quando escreveste este Post? Ou seja, quando estás zangadita tens mais inspiração?
Gostava mesmo de saber, responde sff.

MiudaCute disse...

P.S.: quem diz zangadita diz apaixonada, ou melancólica, ou feliz (euphoria)... o que eu queria saber era qual é o estado de espírito que te dá mais para escrever.

João Ayres disse...

sso é que foi jogar ao ataque Becas, mete-te com ele mete

João Ayres disse...

a querer dar na ‘heroína’..
até dava dava
(desculpa manuela)

João Ayres disse...

não querida (rainha reles), estou a chamar-te “mulher de sonho, daquelas que não reclamam, não nos levam o guito, não choram por tudo e por nada, não estragam as nossas camisas com lixívia e marcas de ferro de engomar, e coisas do género, não...” era isso que eu te estava a chamar

Becas disse...

Lá se vai a lâmpada...

Gema disse...

Era uma vez uma lâmpada...

Gema disse...

(as lâmpadas económicas não são aquelas que duram uma vida inteira? Não, devo estar a fazer confusão)

Becas disse...

Era uma vez uma lâmpada fodi.. fundi..

Rainha Reles disse...

Sendo assim está bem João Ayres, é que pensei que me estavas a chamar robô (tipo bimbi) já estava vai não vai para me pegar contigo.
Vamos ver o Auto da festa (Gil Vicente) ao pé da Capela dos Ossos, é teatro de rua. Alguém quer vir?

Carmina Burana disse...

Rainha Reles: quando eu aí chegasse já o Rascão tinha fugido da velha para não se casar com ela e perdia a parte cómica (do auto da festa e dos comentários ao meu post)já li tudinho e estou c' ma Gema: "E agora, como é que eu saio daqui?"

Carmina Burana disse...

João Ayres: Faz lá isso (apagão), depois eu faço-te uma aurora só para não ficarmos às escuras (andarmos às apalpadelas)

Carmina Burana disse...

Não tem que ser já, hoje é noite de copophonia depois a noite em L.A. acaba cedo há as after-party no Element, (ou as improvisadas na casa de alguém), a aurora espera até de manhã (que tu dês na vodka...)

Carmina Burana disse...

Miuda Cute: hoje deu-te para o jornalismo? Algum comentador(a) desde feed tinha que estar bom da cabeça ainda. Não sei é como é que tu consegues.

Carmina Burana disse...

É quando estou triste que me dá para escrever miúda cute, escrevo caracteres aos milhares. A tristeza (ou a paixão) também despertam o meu sentido de humor. É o meu lado metafórico. Não gosto de chamar as coisas pelos nomes porque me ferem ou porque a realidade mata a beleza que encontro nelas. Este post foi feito de rajada (são todos), mas inspirado em apontamentos que vou tirando para o meu caderninho de capa rija (sim que eu agora tenho um caderninho de capa rija para poder escrever em qualquer lugar e em movimento se for preciso!)
Uma fonte de inspiração para mim é o Pingo-Doce ou o F. Nova (é a mesma coisa), não sei o que é que aquilo tem, se é das pessoas que frequentam aquele supermercado (todos uns cromos, eu incluída) se é de andar às compras (não gosto nada) eu cheguei a tirar (escrever) apontamentos nas caixas de cereais! E antes de ter um caderninho com capa rija escrevia em papelinhos na prateleira das paletes do leite (ou onde calhava) e depois vinha sempre um cavalheiro cortar-me a ideia luminosa a meio: - Olhe a menina não se importa que eu tire um pacotinho de leite meio-gordo não?
E lá ia eu com um sorriso pouco à vontade tirar apontamentos para a arca dos gelados até vir uma criatura: - A menina desculpe, eu só queria ir aos rissóis, a minha nora gosta muito destes rissóis do Pingo-Doce, importa-se?
E eu cheia de ideias a borbulhar na cabeça e tinha que estar a levar com eles! (e eles comigo.)
Não, tirando os apontamentos, já não escrevo à mão, já nem sou capaz porque a mão não acompanha a velocidade do meu pensamento, o word é rápido é mais fácil, há o delete, o move, o copy paste, o corrector ortográfico, o google!
Porque é que não havia de te responder? Ora essa… Para variar até fiz um Post não literário querem ver, assim, de rajada. Bj

João Ayres disse...

antes da copophonia, antes do the Element, antes da vodka (aqui em L. Angeles são 16:00PM) ainda dou um pulinho contigo à inauguração do teclado novo
(I'm watching you Carmina b.)