oreinabarriga

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26.2.08

Aos meus amores


Era de madrugada, metemo-nos no carro, tu conduzes e atravessamos o pontão, uma língua sobre o mar, que eu achava que ía dar algures onde pudessemos parar e namorar e contemplar a maré. Nenhures. A língua foi dar a nenhures. O mais assustador é que ele sabia.
- E agora? Tu és louco ou quê? O que é que fazemos?
- Voltamos para trás?
- A nado??
- Não necessariamente. Podemos fazê-lo de marcha atrás.
- Tu já fizes-te isto?
- Nunca. Vai ser a primeira vez...
O L. ainda quis contemplar a maré.
- Está baixa, vá lá, deixa de estar assustada. Quando quisermos voltamos para trás. Está uma noite tão linda. Não está?
O L. tentou o beijo, todos os beijos, tentou a carícia, todas as carícias, mas a Cleópatra no sarcófago estava certamente mais molinha que eu.
360 metros de marcha atrás, devagar mas sem hesitações, como se tivesse sido a milésima vez e não a primeira vez. Eu apertava uma mão na outra e depois trocava, só pensava que não me tinha despedido de ninguém, nem mãe, nem pai, nem dos colegas da C.S.
- Tira o cinto.
Ainda hoje não sei se estava a brincar quando disse:
- Tira o cinto.
Se foi para me assustar ainda mais, se precavia que fossemos a qualquer altura, num deslize, findar no fundo do mar.
Com os pés em areia firme, amuei e fumei um cigarro, não disse uma palavra. O L. roçava os lábios dele em mim e a pontinha do nariz, por trás no remoinho a cima da primeira vértebra.
- Se não houvesse maneira de voltar atrás, ficavas lá comigo para sempre? - E apontou com o braço inteiro a terminar no dedo em riste, mais um nada e pareceu-me que tocava na pontinha da língua, até onde tínhamos chegado.
- Ficavas lá comigo para sempre? Ficavas?
Eu não disse uma palavra. A boca dele esteve sempre lá, mesmo durante a pergunta, a cima da primeira vértebra. Ao cabo da outra mão, que não apontava para lado nenhum, segurava também um cigarro, um cigarro que cheirava a tabaco e a eternity ao mesmo tempo... Eu não disse uma palavra, mas desde então, sabes bem. Sabes bem que nunca regressamos. Que não estás aqui e eu, eu nunca mais voltei. Sim, fico lá contigo, para sempre meu amor.