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10.7.05

Diário do nascimento de uma mãe VI

Domingo, dia 10 de Julho
"A grande 'nóia'!

Parece que tudo gira à minha volta e todos dependem de mim.
O meu filho depende de mim, mas infelizmente não tenho todo o tempo do mundo para lhe dedicar em exclusivo, sobretudo para o contemplar e fico angustiada porque o tempo passa num instante e um dia vou perceber que ele cresceu depressa, um dia vou constatar que tenho todo o tempo do mundo para lhe dar, mas ele já não precisa de mim.
Já não suporto as perguntas inúteis do pai e faz-me confusão ele passar horas infinitas em busca de uma determinada chucha do Miguel, quando ele tem várias, de uma camisola do “Hard Rock Caffé” que ele só vestirá daqui a 4 anos e portanto, qual é a urgência em ter que a encontrar precisamente hoje? Agora? Qual é a razão para me impacientar querendo saber aonde pára uma caneta azul quando o dispensário das canetas está cheio de outras que servem perfeitamente?
O pior é que os objectos destas investigações profundas, levadas a cabo pelo pai e acompanhadas de penosos questionários, acabam por aparecer (quem é vivo, sempre aparece) só que termina uma investigação, logo abre processo de outra! Estou farta! Maldita paranóia!
Já tentei que fossemos ao psicólogo porque eu não consigo tratar do meu filho e do pai dele também. E de mim, muito menos, mas acredito que de mim, trata o tempo. Pedi ajuda aos pais dele, mas não os encontrei capazes de compreender aquilo a que se chama depressão pós parto. São capazes até de me ouvir falar e depois desabafar para os seus botões: Modernices!
Só me resta fechar-me à chave se for à casa de banho, se for ao escritório, ou se estiver a dar de mamar ao meu filho, no meu quarto. Peço encarecidamente ao Ricardo que me deixe em paz mas ele não obedece, transformou-se na minha sombra, na minha banda sonora de fundo. Peço para se calar, preciso urgentemente de silêncio e o nosso filho também, mas ele não se cala, dos nervos. Assim ao menos, trancada, a porta amortece o som que vai dando comigo em louca e vai irritando o Miguel também.
De madrugada, fumo um cigarro à janela se o meu filho me deixar e pergunto, a mim mesma, julgo, aonde vou buscar tanta coragem…

2ª Feira, dia 11 de Julho
“A queda do cordão”

Hoje de madrugada, mais precisamente às 00:22 caiu o cordão umbilical do meu filho. Ficou o umbigo destapado, limpinho que só visto! Para comemorar, logo vou enfiar o meu “piercing” (se o furinho não estiver já cerrado) e seremos os umbigos mais “sexy” do quarteirão!
Para o meu filho tudo é novidade. Tudo menos a mãe, claro.
Os soluços vêm como as horas. O pai diz que o Miguel quando soluça parece o boneco que anda pendurado no retro visor da carrinha do avô Vítor. Se apertarmos a barriga ao boneco, ele também chia assim.
Depois dos soluços vêm os “puns”. Até serem libertados provocam ao Miguel uma estranheza e uma ansiedade que ninguém consola.
Arrotar é preciso, mas não há maneira dele aprender a soltar esse ar. De modo que mal o deitamos, depois dos soluços e dos “puns” e da fralda mudada, e da roupinha lavada, acontece o bolçar e recomeça tudo outra vez! “ Menino bolçado, menino criado”. Pois, pois, a mim é que elas me mordem… Que trabalheira! Mas recordo-me do tempo que eu levei a aprender a engolir um comprimido, já em criança a aprender a fazer uma laçada (ainda hoje, com quase 33 anos, não sei fazer uma laçada como deve de ser), como é que posso pedir ao meu filho que em pouco mais de uma semana, aprenda a fazer todos estes exercícios? Não posso, pois claro que não posso…
Pela manhã achei que se colocasse o Miguel deitado junto do pai, ele adormecia e eu ia à minha vida, tratar da casa, das limpezas, das roupas, das arrumações, do almoço e tudo o mais, mas o Miguel só me concedeu 10 minutos, assim que apanhou o pai a dormir, vomitou para cima dele! Lá fui eu a correr, a SOS mamã, com uma fralda, tratar de limpar o estrago porque o pai, como se sabe, está com braço engessado e incapaz de resolver estas e outras emergências. Mas fez o almoço o que já ajuda substancialmente.
Para o Miguel acalmar, canto-lhe a canção do Jardim-Zoológico, cujos direitos de autor, pertencem ao avozinho João.
“ O crocodilo (tem que começar sempre pelo crocodilo) mordeu no rabo da girafa e a girafa foi morder no rabo do canguru e o canguru foi morder no rabo do passarinho e o passarinho foi morder no rabo do rinoceronte… “ E como o Miguel demora uma eternidade a acalmar, faltam-me animais, de modo que introduzo algumas personagens que não fazem parte da cantiga original… “... E o rinoceronte foi morder no rabo do aviãozinho e o aviãozinho foi morder no rabo da vizinha e a vizinha foi morder no rabo da panela da cozinha…etc., etc. ”
Ainda não consegui dar banho ao Miguel na banheira. Os pontos doem-me horrores se me sento, os meus rins queixam-se mais ainda. Depois são as visitas que empatam uma tarde inteira a uma pessoa. Se a minha sogra, a minha mãe e o pai do meu filho também, não dessem tantos palpites, eu ainda tinha a esperança que em breve, as coisas voltariam ao lugar. Nesses períodos desconfortáveis, em vez de me impor ou contar até 10, vou mas é cuidar do meu filho e digo para mim mesma que ninguém conhece melhor o meu filho do que eu. Conheço bem a razão de cada choro. Conheço bem cada sinal particular. Vão todos à fava!
Estou horas a dar-lhe de mamar o que representa sobretudo de noite, um autêntico sacrifício. Os palpites dão-se, uma para não estarmos calados, duas porque não custam nada.
Que faria o pai se não dormisse à quase 15 dias consecutivos? Que faria o pai se às 10 da noite, em vez de se ir deitar cheio de sono, muito cansado, já sem forças sequer para esperar pela mãe para lhe dar um carinho, tivesse ainda que mudar uma fralda, adormecer o Miguel nos braços para que não se sinta só? Ao pai (que ainda está de baixa) que se lamentava de se levantar todos os dias às 6 da manhã para ir para o trabalho e afirmava que se eu estivesse no lugar dele, entenderia o seu cansaço e não aguentava, eu respondo-lhe agora, a braços com o meu pequenino, de dia, de noite e de madrugada. Sem precisar dizer nada…

3ª Feira, dia 12 de Julho
“A ida ao pediatra”

A pediatra, a Dr.ª Marinela do Posto Médico, foi a única pessoa até agora capaz de avaliar o meu cansaço, foi a única pessoa que reconheceu em mim, um estado quase irremediavelmente depressivo. Só por isso estou-lhe grata. Só por ter reparado em mim, entender perfeitamente tudo aquilo por que passei, só por isso, estou-lhe imensamente grata e sinto-me muito melhor…
Quanto ao Miguel, vai fazer uma ecografia aos membros inferiores quando completar um mês para despistar problemas na anca. Deus queira que não seja nada. A Dr.ª examinou-o muito bem, testou-lhe os reflexos e receitou leitinho em pó para o Miguel tomar quando ficar com as avós.
Depois fui à escola mostrar o meu filho às colegas do trabalho. Apesar das férias escolares, encontramos quase toda a gente. E todos adoraram o Miguel e esperaram que acordasse para lhe pegarem ao colo.
O meu filho é a minha única vaidade!

4ª Feira, dia 13 de Julho
“O desassossego”

Hoje pela manhã o meu filho foi levar a vacina da BCG contra a Tuberculose. É uma vacina que dói, demora porque não é uma simples picada, mas o Miguel demonstrou muita coragem e só choramingou um bocadinho.
Receio a perda do meu leite. Verifico o “biquinho” de silicone em cada mamada e só vejo água. O meu filho chora sempre se o deito, sinto que não fica satisfeito. Que sentimento horrível passa por mim. Quase de desespero. O que é que eu faço? Quando decido telefonar para as enfermeiras do posto, já não são horas. Vejo-me com o meu filho nos braços, de rastos porque ele chucha no meu peito durante duas horas e só assim está sossegado, eu já não aguento passar as noites em claro, eu já não aguento ver o meu filho nesta insatisfação. Dava tudo para o sossegar…

5ª Feira, dia 14 de Julho

Afinal mesmo a água que o meu leite parece ser às vezes é um alimento precioso. Está tudo nos livros que tenho cá em casa e nos artigos das revistas, escritos por quem sabe tudo sobre bebés melhor até, em dadas circunstancias, que a própria mãe. Hoje já tive leite. O Miguel até bolçou uma grande quantidade dele, esbranquiçado e consistente.
À tarde vieram a tia Laurinda, o tio Abel e o primo Nuno. São da família do Ricardo.
Consegui ir à tabacaria que fechava às 19 horas. O Miguel acabou de mamar quase lá! Foi por um triz!

6ª Feira, dia 15 de Julho, 12º dia
“E é amar-te assim perdidamente… "

O meu filho é a única pessoazinha que gosta de me ouvir cantar. Canto sempre a mesma melopeia, não por não saber outras, mas gosto de cantar para o meu filho aquilo que sinto por ele.
Trovante : Ser Poeta
Música:
João Gil
Letra: Florbela Espanca

Ser poeta é ser mais alto, é ser maiorDo que os homens!
Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Áquem e de Além Dor!
É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!
É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhas de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!
E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dize-lo cantando a toda a gente!

“Ser poeta é ser mais alto, e é ser maior do que os homens

Sábado, dia 16
"Afinal, há biberon's!"

Hoje descobri a maravilhosa invenção do biberon!
Adeus dores nos rins, adeus mamadas de duas horas, adeus noites em claro. O meu filho bebe um biberon de leite em 10 minutos e dorme satisfeito com carinha de anjinho. Outra maravilhosa invenção foi o Aero-Om, um remédiosinho cor-de-rosa que sabe a bebida de passarinho e que é delicioso para todos os bebés. Umas gotinhas na língua antes das refeições sossegam as cólicas e é assim que o Aero-Om se deve tomar, mas umas gotinhas na chucha quando o bebé não pára de chorar, fazem milagres! O Miguel até leva as mãos à chucha para a segurar contra a boca e fica a chuchar com uma careta muito engraçada até adormecer.
Comecei hoje a tomar a pílula da amamentação embora sexo seja a última das minhas vontades. Os pontos ainda não secaram e de resto o bebé consome todo o tempo e todas as nossas energias, mas quando lá chegar, vou usar preservativo também por via das dúvidas!

2ª Feira, dia 18

O pai vai ficar mais tempo de baixa porque voltou a colocar gesso no braço.
Ainda tem as férias para gozar também. Do mal, o menos, assim é da maneira que vê o seu filho crescer e acompanha todas as nossas tarefas com a vantagem de não poder ajudar em nenhuma delas!
Agora só dou de mamar durante o dia, à noite o meu filho bebe leitinho no biberon. Eu durmo mais tempo e o meu filho dorme melhor. Durante o dia custa menos dar de mamar, não tenho tanto sono, nem sinto tanto desconforto. Quem diz que amamentar um bebé ao peito é mais prático não me parece que tenha razão. É sim mais económico. Há que admitir que esterilizar biberons não é nenhum sacrifício e um biberon de leite prepara-se em três tempos com a ajuda de um aquecedor de biberon’s, ou de um termo para manter a água aquecida (que foi a minha opção), ou até mesmo do micro-ondas. O biberon poupa-nos o tempo, ansiedade, controlamos melhor o leite que bebe, é confortável, é prático. Embora continue a amamentar o meu bebé, reconheço que o colostro que produzimos na altura do nascimento do nosso filho é o único líquido insubstituível neste processo, a partir daí, devemos encontrar a maneira mais conveniente para nós. O que nos faz bem a nós é o que faz bem ao bebé também.


3ª Feira, dia 19
"A sós"

O Ricardo almoçou cedo e foi com os pais para a Sertã.
Ainda só passaram meia dúzia de horas e é incrível como o meu bebé está mais calmo. Ficamos a sós. Vou aproveitar este silêncio, esta paz para conhecer melhor o meu filho. Agora e durante estes dias, só ele existirá para mim.

4ª Feira, dia 20

O pai não está cá para ditar as horas do comer. Quem dita agora os horários cá em casa é o meu filho. Não o divido com mais ninguém e ele tem agradecido com largos sorrisos e longas sestas. Não há interrogatórios compridos e inúteis. O silêncio predomina. A Mariana, a Sara e a mãe vieram visitar o Miguel e trouxeram um presente de boas vindas.
A Mariana, que é a mais pequenina, diz que o Miguel é mais pesado que o "Nenuco".
Descobri que o meu filho gosta de adormecer só com a fralda. Mais tarde vou cobri-lo com a mantinha de algodão. Descobri também que a cadeira do escritório faz de carrossel!

5ª Feira, dia 21
"300 gramas a mais"

Comecei o dia com uma grande alegria. O meu filho engordou 300 gramas! Com 19 dias de vida pesa 3.220Kg. Ao contrário da maior parte dos bebés, o Miguel não perdeu peso desde que nasceu. Muito pelo contrário. Isto não faz de mim uma boa mãe por si só e faria com que as mães de bebés que perdem peso, tivessem obrigatoriamente culpa disso, mas fiquei entusiasmada, feliz. Sou mãe há muito pouco tempo e como todas as mães sinto-me frustrada e triste quando ele chora e não sei a razão e fico animada e feliz quando ele está bem. São estas pequenas alegrias que me dão alento. Que me encorajam. Afinal, estou a conseguir!
À tarde fui fazer compras para o Feira Nova, aqui ao pé de casa. O Miguel ficou com a avozinha. Mesmo sabendo que estava bem entregue, que não havia pressa, não me contive e andei a correr com receio do tempo andar mais depressa do que eu.
Falta-me o meu filho nos braços. É como a carteira ou as chaves de casa, se ficam em casa, esquecidas, sentimos a falta de não sei o quê.
A hora do banho não é muito agradável. Pela beicinha que ele faz quando termina, noto que ficou magoado comigo por o ter submetido a tal coisa! Mas com o tempo há-de vir a gostar. Todos os bebés gostam, afinal, durante toda a gravidez é embebidos que eles se encontram!

6ª Feira, dia 22

O pai chega hoje da Sertã e acabaram as nossas “férias”.
O meu filho continua a mamar durante duas horas. Os primeiros dez minutos são convincentes, de resto, a minha mama serve de chucha para ele adormecer. E é impressionante como nada o acorda, a não ser retirar-lhe o peito, quando está nisto, nem a música, nem os ruídos, nem os meus movimentos, nem as cócegas, nada! Quando já não posso mais tê-lo no meu colo desata num berreiro que só termina quando lhe dou o biberon.
Não tardará muito para que o meu leite seque. Tenho que comprar uma bomba para poder extraí-lo como deve de ser. Muito embora me custe dar de mamar, não queria desistir completamente.

Sábado, dia 23

A minha amiga Beta, o Jorge e o Tomás vieram visitar-nos depois do jantar. Estivemos imenso tempo na cozinha a relembrar as complicações do primeiro mês do meu “sobrinho”. Para a Beta também foram tempos difíceis aqueles em que o Tomás chorava de dia e de noite e ia perdendo peso até que numa das idas ao Hospital, uma médica detectou que ele não fazia xixi, de maneira que não estava bem alimentado. Chorava de fome! Depois vieram a pneumonia, a varicela, enfim, nunca mais me queixo das minhas noites em claro! Bem sei que o meu filho não é propriamente “come e dorme” como era o bebé da Sandra, mas não é dos piores!

4ª Feira, dia 27
"Um farrapo"

Só para não me ter gabado no capítulo anterior e ter prometido não voltar a queixar-me das noites em claro, estes dias têm sido do pior!
Mudo a roupa toda da caminha dele enquanto ele espera, num choro inconsolável, dentro da alcofa. Entretanto vomita na alcofa e os lençóis, as fraldas e a roupa vão-se amontoando no alguidar. Esta semana, até a roupa da minha cama tive que mudar duas vezes!
Como eu gostaria de contar com o pai durante a noite para mudar uma fralda que fosse. Ou dar um biberon. Ou dar colinho quando eu não consigo abrir os olhos nem para pôr umas gotinhas de soro fisiológico e o Miguel está com soluços, ou tem cólicas ou simplesmente não tem sono nenhum. Enquanto o Ricardo toma “Sedoxil” para dormir eu precisava de um remédio para estar constantemente acordada!
O stress acumula-se, as limpezas, a roupa e os biberons no lavatório também. Bebo café para espevitar e fumo um cigarro nos intervalos deste martírio. Olho à volta e está tudo por fazer. Na campainha da nossa porta está sempre o dedo de uma visita, o telefone não para de tocar, toda a gente quer saber notícias do Miguel e ele está lindo! Crescido. Saudável no meio disto tudo. Tudo isto eram boas razões para eu andar feliz não fosse este maldito esgotamento!


Sábado, dia 30

Dia do casamento da Sandra e do Hélder.
O Miguel ficou na casa da avozinha Ana e do Avozinho João. É o primeiro dia inteiro que passamos longe um do outro. Tenho os braços vazios...

Ao fim da tarde o meu peito desatou a doer e a enrijecer. Fizemos mal não ter ido a casa para eu dar de mamar ao meu filho. Foi a primeira coisa que fiz assim que chegamos a casa dos meus pais. Acabei por ficar lá a dormir e o Miguel ficou tão cheio de leite que não pediu biberon nem pediu mais nada!

Domingo, Dia 31
“As borbulhas”

O meu filho acordou ontem com as bochechas salpicadas de borbulhas pequeninas e vermelhas. Tratei de lavá-las com soro mas elas resistiram e depressa se espalharam pelo queixo e pela testa!
O meu pequenino, pobrezinho, está todo molestado!

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